O presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, discursou ao Parlamento da Itália nesta terça-feira (22) por cerca de 12 minutos e fez um pedido extenso para que os italianos ajudem a parar a guerra "feita por uma só pessoa que todos sabem quem é", além de comparou as tropas russas aos nazistas.
Durante todo o seu discurso, o mandatário não citou o nome do líder russo Vladimir Putin, mas fez duros ataques contra o chefe do Kremlin.
Ovacionado antes mesmo de falar, Zelensky abriu sua fala citando a ligação que fez pouco tempo antes para o papa Francisco e disse que entende o discurso de que é preciso "defender a paz".
"Entendo que vocês defendem a paz, que os militares defendem as pessoas civis, os militares defendem cada um. O nosso povo se tornou o exército quando viu o mal que o inimigo causa, quando viu todo o derramamento de sangue. Uma semana atrás, em um discurso para os europeus, pedi para que todos lembrassem do número 79. 79 era o número de crianças mortas naquele momento e agora são 117. Esse é o efeito da procrastinação de fazer a pressão sobre a Rússia para parar a guerra", disse o mandatário.
Zelensky lembrou das cenas vistas nos últimos dias das crianças órfãs, das casas destruídas por bombardeios russos e das pessoas enterrando as vítimas "nas ruas, nos parques, nos pátios das casas".
"Eles não param de nos atacar e nos atacam continuamente. Algumas cidades foram destruídas totalmente, como no caso de Mariupol, que tinha 500 mil pessoas como a sua cidade de Gênova. Imaginem uma Gênova completamente queimada, imaginem a vossa Gênova com as pessoas fugindo a pé, de carro, de ônibus, de trem em busca de uma cidade que seja mais segura", afirmou aos parlamentares comparando as duas cidades portuárias.
O presidente ainda ressaltou que está falando da capital Kiev, "cidade para nós tão importante como Roma é para o mundo".
"Estamos no limite da sobrevivência, daquilo que vocês sabem porque também viveram em guerras ferozes. Todo mundo tem o direito de viver em paz, em uma paz contínua, assim como é em Roma. Aqui em Kiev caem bombas todos os dias, há ataques diários", pontuou.
Nesse momento, Zelensky voltou a comparar a ação das tropas russas na Ucrânia com os nazistas durante a Segunda Guerra Mundial. "Ao nosso redor em Kiev, há muitas tropas russas. Eles torturam, violentam, raptam nossas crianças, destroem e com seus caminhões levam embora nossos bens. A última vez que isso aconteceu na Europa foi com os nazistas", destacou.
"Essa é uma guerra criada e planejada há muito tempo por uma única pessoa que usou o dinheiro arrecadado há anos com o gás e o petróleo enviado para a Europa e agora usa nisso. E isso não é uma guerra contra a Ucrânia, é uma guerra contra toda a Europa, contra todos os valores europeus. A Ucrânia é a cancela dessa única pessoa para ir além", disse novamente citando Putin nas entrelinhas.
Durante a fala, Zelensky lembrou que Kiev esteve próxima dos italianos durante a pandemia de Covid-19, enviando médicos e ajuda humanitária para o país no momento mais grave da crise sanitária em 2020. E também destacou que os italianos ajudaram os ucranianos durante as inundações gravíssimas do ano passado.
"E fizemos tudo isso sem esperar nada em troca, nenhum favor a mais", acrescentou. Nesse momento, Zelensky - assim como fez em discursos em outros Parlamentos pelo mundo - voltou a pedir um aumento nas sanções econômicas contra Moscou e seus aliados para fazer a guerra parar o mais rápido possível.
"Façam com que a Rússia e essa única pessoa queiram buscar a paz. Vocês conhecem bem a Ucrânia, um povo que não quis nunca quis a guerra, um povo europeu como vocês. Vocês sabem quem fez a guerra, a única pessoa que dá ordens e vocês sabem quem somos. Precisamos bloquear tudo deles, suas contas, seus bens, precisamos congelar todos os bens de todos que tenham a ver com essa guerra", disse ainda.
Zelensky fez um apelo para que os portos italianos e de toda a União Europeia fechem para os navios russos e lembrou que a guerra na Ucrânia já atinge a todos por conta da fome e da crise alimentar que se espalha pelo mundo.
"A Ucrânia sempre foi um grande exportador de alimentos, mas como podemos semear se os russos nos atacam? Como podemos cultivar se somos atacados com bombas? Nós não podemos mais exportar, não temos como exportar o trigo, o milho, entre outros produtos que vão faltar no mundo", acrescentou.
Falando que todos vão precisar "reconstruir juntos a Ucrânia", Zelensky fez elogios à Itália na parte final do discurso e agradeceu ao acolhimento de mais de 60 mil refugiados que conseguiram escapar do conflito.
"Eu visitei muito o país de vocês, vi a força das suas relações, vi o que significam a família e os filhos para vocês, o que significa a vida. Obrigado por acolher os nossos irmãos, que são mais de 60 mil dos quais 25 mil são crianças. Foi na Itália que nasceu o primeiro ucraniano de uma mãe que fugiu da guerra. Nossas crianças estão sendo cuidadas em seus hospitais e eu agradeço por isso. Os ucranianos vão se lembrar sempre de vocês, de seu carinho, de sua ajuda e, por isso, afirmo que precisamos parar uma só pessoa para que isso acabe. Viva a Ucrânia", finalizou.
Novamente, o presidente foi ovacionado de pé por todos os presentes na sessão especial.
Draghi
Após o discurso de Zelensky, foi a vez do primeiro-ministro italiano, Mario Draghi, fazer um discurso e dizer que o governo, o Parlamento e todos os italianos "estão ao lado de vocês".
Diferentemente do líder ucraniano, Draghi citou nominalmente o presidente Putin por mais de uma vez e criticou a postura "arrogante" do governo de Moscou.
"A Ucrânia é vítima de uma guerra insensata, que não poupa os civis, que mata as crianças e impede a fuga de civis por corredores humanitários. Estamos ao lado de vocês. Quero agradecer o presidente por sua incrível coragem. Desde o início da guerra, a Itália admira o presidente, seu povo, a sua força", iniciou falando o chefe de governo.
"A arrogância do governo russo enfrentou a força dessa população, que se negou a permitir o expansionismo russo. Em Mariupol, Kharkiv e em todas as partes onde recai a feroz guerra do presidente Putin, a resistência é heroica", adicionou sendo muito aplaudido.
Durante a sua fala, Draghi lembrou das medidas aprovadas pelo governo - e agradeceu a maioria e "os principais partidos de oposição por seu apoio unânime" - e a ajuda humanitária enviada pela população para a Ucrânia "desde os primeiros dias de guerra".
"Os italianos abriram ainda a porta de suas próprias casas para acolher os ucranianos, um senso de acolhimento que é orgulho do nosso país. E continuaremos a ajudar por meio do governo, das cidades, das regiões, das associações, das instituições religiosas porque em tempos de incivilidade, a Itália não vira as costas", pontuou sendo aplaudido novamente.
Sobre as sanções, Draghi destacou que o governo "está pronto para fazer mais" e que o país está mudando de "forma muito rápida suas formas de energia para ser menos dependente do gás e do combustível da Rússia".
"Putin quis nos dividir, mas nos unimos ainda mais. Na Itália, congelamos bens em mais de 800 milhões de euros de oligarcas que foram afetados pelas sanções europeias. E estamos trabalhando na União Europeia para que o processo de adesão das nações seja mais rápido", disse.
"A Itália quer a Ucrânia na União Europeia. Quando o horror e a violência são o vento que sopra, nós precisamos defender os valores humanos e os democráticos. A quem escapa da guerra, devemos oferecer acolhimento. Diante dos massacres, precisamos dar a ajuda - e também a ajuda militar. Ao crescente isolamento internacional do presidente Putin, precisamos impor a unidade da comunidade internacional. A Ucrânia tem o direito de ser segura, livre e independente", finalizou.
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