O presidente da Itália, Sergio Mattarella, prestou um novo juramento para assumir a chefia de Estado por mais sete anos nesta quinta-feira (3).
Em um longo discurso, que abordou a democracia, a pandemia de Covid-19, a dignidade e conflitos europeus, o político foi ovacionado por 55 vezes por todos os presentes - e por cerca de três minutos no fim da sua fala.
Mattarella começou o discurso afirmando que "não esperava" ser reeleito para o cargo, mas que jamais poderia "fugir da responsabilidade" de chefiar o Estado novamente. "No momento que os presidentes da Câmara e do Senado me comunicaram o êxito da votação, eu falei de urgências - sanitária, econômica e social - que nos afetam.
Não podemos permitir atrasos e nem incertezas. A luta contra o vírus [da Covid-19] não terminou, a campanha de vacinação reduziu muito os riscos, mas não são permitidas desatenções", acrescentou.
O líder ainda ressaltou que as expectativas dos italianos "seriam fortemente comprometidas no prolongamento de uma profunda incerteza política e das tensões, as quais poderiam colocar em risco também os recursos decisivos e as perspectivas de retomada do país que está empenhado em sair de uma condição de grande dificuldade".
Segundo o presidente, agora é a hora de "desenhar e iniciar a construção, nos próximos anos, da Itália do pós-emergência". "É ainda tempo de criar um compromisso comum para tornar a Itália mais forte, para além das dificuldades do momento. Uma Itália mais justa, mais moderna, intensamente ligada aos povos amigos que estão ao nosso redor", disse.
Conforme o antecipado, Mattarella focou boa parte do discurso na importância do papel da Itália na União Europeia. Para o presidente, o país "vive uma fase extraordinária no qual a agenda política é em grande parte definida pela estratégia compartilhada com base europeia".
"Somos os maiores beneficiários do programa Next Generation e precisamos retomar a economia com base na sustentabilidade e na inovação, no âmbito da transição ecológica e digital", pontuou.
"Reforçar a Itália significa também torná-la apta para orientar o processo de retomada europeia para que essa se torne mais eficiente e justa e para tornar estável a virada vista nos dias mais difíceis da pandemia. A contribuição da Itália não pode faltar: é preciso ideias, propostas e coerências com os compromissos assumidos", ressaltou.
Sem citar diretamente o nome dos países envolvidos, mas referindo-se à crise ucraniana, Mattarella afirmou que "não se pode aceitar que agora, sem nem o pretexto de uma competição entre sistemas políticos e econômicos diferentes, se alce novamente os ventos dos conflitos".
"Em um continente que conheceu as tragédias da Primeira e da Segunda Guerra Mundial, precisamos fazer um apelo para os nossos recursos e para aqueles dos países aliados e amigos para que as demonstrações de forças sejam trocadas pelo entendimento recíproco para que nenhum povo tema a agressão por parte de seus vizinhos", acrescentou.
Questões internas -
Grande parte do discurso de Mattarella foi em defesa da democracia e dos direitos dos italianos. O presidente elogiou os partidos e o governo de Mario Draghi, mas ressaltou que a democracia do país depende de um "Parlamento forte" e que inclua, cada vez mais, pessoas de fora da política para que elas possam se expressar.
"A Itália precisa crescer em unidade, no qual as desigualdades, territoriais e sociais, que atravessam as nossas comunidades diminuam. Uma Itália que ofereça aos seus jovens percursos de vida no estudo e no trabalho para garantir a coesão do nosso povo. Uma Itália que consiga superar o declínio demográfico ao qual a Europa aparenta estar condenada. Uma Itália que traga vantagens da valorização das suas belezas, oferecendo seu próprio modelo de vida a tantos no mundo. Uma Itália empenhada na tutela do ambiente, da biodiversidade, dos ecossistemas, consciente das responsabilidades na relação com as futuras gerações", acrescentou.
"Ao governo, exprimo um convicto agradecimento e desejos de um bom trabalho", citando ainda a união em torno do nome do premiê Mario Draghi.
Ovacionado quando falou que é preciso "respeitar o tempo de tramitação no Parlamento", Mattarella disse que é preciso equilibrar o respeito aos caminhos da garantia democrática e ter a rapidez para saber aprovar medidas que beneficiem o "bem comum".
"O desafio, que ocorre em nível mundial, para proteger a democracia atinge a todos e, sobretudo, as instituições. Dependerá, em primeiro lugar, da força do Parlamento, da elevada qualidade das atividades que ele desenvolve, das necessárias adequações de procedimentos", acrescentou, ressaltando que pode servir de modelo a união de todos os profissionais sanitários durante a crise de Covid-19.
Papa e dignidade -
Na parte final do discurso, Mattarella repetiu por 18 vezes a palavra "dignidade", que considera fundamental para a Itália do futuro.
Entre os principais pontos citados, estavam a dignidade das mulheres tanto no combate ao feminicídio e a violência contra elas - que classificou como "praga" - como em transformar o país em um local em que elas não sejam excluídas do ambiente de trabalho ou tenham que "escolher entre a carreira ou a maternidade".
Mattarella também lembrou das recentes mortes no trabalho e pediu dignidade para garantir a "segurança da vida" dos trabalhadores. Também afirmou que os estudantes devem ter o direito de futuro e que todos devem se preocupar que as crianças e jovens tenham um ensino de qualidade.
O presidente criticou o "racismo e o antissemitismo e as agressões intoleráveis contra as minorias". Também criticou a indiferença que muitas vezes atinge as pessoas sobre os migrantes e disse que é necessário "combater o tráfico e a escravidão de pessoas".
O chefe de Estado defendeu ainda a liberdade de informação das pessoas e que dignidade também é ter "um país livre da máfia, da extorsão e da criminalidade".
Nominalmente, Mattarella lembrou de algumas personalidades em destaque. Um dos citados, foi o papa Francisco "o qual o magistério a Itália guarda com grande respeito e exprimo sentimentos de reconhecimento do povo italiano".
Ao falar da importância da cultura, Mattarella lembrou da atriz Monica Vitti, que faleceu nesta quarta-feira (2) aos 90 anos. "Quero fazer uma homenagem a Monica Vitti, grande protagonista da vida cultural do nosso país", disse sob aplausos.
"A Itália é o país da beleza, da arte, da cultura, assim o mundo olha para a gente. A cultura não é supérfluo, é um elemento constituidor da identidade italiana. Façamos de maneira que esse patrimônio se torne um recurso ainda maior para gerar conhecimento", ressaltou.
Também foi lembrado o presidente do Parlamento Europeu, David Sassoli, que morreu no dia 11 de janeiro, por ser um exemplo de "um homem corajoso, sempre aberto ao diálogo e capaz de representar as instituições democráticas nos níveis mais altos".
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