Por Nadedja Calado - Mais de 350 milhões de eleitores poderão ir às urnas nos 27 Estados-membros da União Europeia entre esta quinta-feira (6) e o próximo domingo (9). Eles escolherão os 720 deputados (a Itália tem 76 cadeiras) da próxima legislatura de cinco anos do Parlamento Europeu, única casa legislativa transnacional eleita por sufrágio direto.
O pleito deve ser marcado por um avanço inédito de forças de direita e ultradireita, segundo especialistas ouvidos pela ANSA.
"Essa eleição é um caso único. Existem paralelos de parlamentos supranacionais, como o Parlamento do Mercosul, mas sem eleições diretas e sem o mesmo prestígio, o mesmo poder.
Essa importância cresceu com o Tratado de Lisboa, de 2009, que deu ao Parlamento Europeu o poder de co-decisão em legislações que vão ser usadas por todos os países que integram a União Europeia, e a eleição pode ser um termômetro importante das estratégias entre os países", explicou Cícero Krupp da Luz, doutor em Relações Internacionais pela USP e professor da Unisinos.
Os eurodeputados se dividem em grupos políticos, definidos não por país, mas por afinidade ideológica. Atualmente há sete: Partido Popular Europeu (centro-direita), Aliança Progressista dos Socialistas e Democratas (centro-esquerda); Renew Europe (liberal); Verdes/Aliança Livre (causa ambiental); Grupo da Esquerda (esquerda); Reformistas e Conservadores e Identidade e Democracia (direita e extrema-direita).
Os olhares estão voltados principalmente para os dois últimos, que, segundo projeções, podem dobrar sua presença na Eurocâmara. O grupo Identidade e Democracia tem 76 eurodeputados e é liderado pelo italiano Marco Zanni, da Liga, e associado principalmente a uma de suas fundadoras, a francesa Marine Le Pen, do Reagrupamento Nacional. Os Reformistas e Conservadores têm atualmente 74 eurodeputados e são liderados pela primeira-ministra da Itália, Giorgia Meloni.
"Existe uma expectativa de que eles cheguem a ocupar em torno de um quarto do Parlamento. Eles vêm numa crescente desde 2014, com uma linha bastante uniforme", lembrou David Magalhães, professor de Relações Internacionais da FAAP e PUC-SP. Ele destacou que países grandes do bloco vão contribuir para o cenário, com as prováveis vitórias do Reagrupamento Nacional na França e do Irmãos da Itália. O Vox, da Espanha, e o Chega, de Portugal, também devem conquistar novas cadeiras.
O Alternativa para a Alemanha viveu uma recente controvérsia quando seu líder, Maximilian Krah, relativizou o nazismo em uma entrevista e a sigla acabou expulsa de seu grupo político europeu, mas ainda assim deve crescer nas eleições.
Magalhães pontuou que, embora essas forças de direita e ultradireita tenham pautas em comum, como a repressão à migração irregular, outros temas, como a posição no conflito entre a Rússia e a Ucrânia, dificultam a união: "Embora a ultradireita cresça no Parlamento, ela vai continuar muito fragmentada e incapaz de se estabelecer como um bloco coeso e de estabelecer uma agenda que possa pressionar o mainstream democrático. Pode conquistar ou atrapalhar algo em temas em que têm mais coesão, como em migração e pautas ambientais, mas em outras coisas costumam divergir".
Além dessas pautas específicas, os grupos políticos citados representam uma espécie de sentimento antieuropeu. A sigla italiana Liga, de Matteo Salvini, usa como slogan de campanha "Mais Itália, Menos Europa". Giorgia Meloni, ao se eleger pelo Irmãos da Itália, acenou com uma plataforma anti-europeia, mas hoje mantém uma relação de pragmatismo com as instituições do bloco e um posicionamento reformista.
Para Krupp da Luz, a estratégia nacionalista anti-UE não se sustenta: "Algumas contradições ficam muito evidentes, como do ponto de vista econômico. A ruptura desses países com a União Europeia significaria perdas enormes para todas as camadas sociais, inclusive as mais privilegiadas".
O acadêmico cita como exemplo um comunicado, divulgado no último dia 7, assinado por algumas das maiores empresas alemãs, como Siemens, BMW, Deutsche Bank, Bosch e Mercedes, contra a extrema-direita e pedindo voto consciente.
"Isso mostra que a Alemanha precisa da Europa, dos estrangeiros não-europeus, para continuar sendo uma economia dinâmica, profícua. Esses projetos populistas nacionalistas mentem para o público, se alimentam de determinados sentimentos das pessoas", avaliou o professor da Unisinos.
As eleições europeias, que só perdem em número de eleitores para a Índia, registraram 50% de comparecimento em sua última edição. Pesquisas indicam que o comparecimento em 2024 pode crescer, chegando a 60%.
Atualmente a casa legislativa é comandada pela maltesa Roberta Metsola, do PPE, que assumiu em 2022 após a morte do italiano David Sassoli. A composição do Parlamento também vai determinar a continuidade ou não de Ursula von der Leyen, também do PPE, no comando do Poder Executivo do bloco - o grupo político que conquistar o maior número de assentos terá a prerrogativa de indicar o próximo presidente da Comissão Europeia.
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